sexta-feira, 27 de julho de 2018

Orquestra Ligeira do Exército

Era uma noite de nortada, uma noite clássica em Lagos. A turba estava encolhida, de casaco, calças e sapatos fechados. As gaivotas passavam a voar descontroladamente a favor do vento por cima do palco. Pensei em como poderia ter sido agradável que fosse uma noite de sueste, com aquela humidade quente e sem vento. Mas olhei para a frente e vi as velhinhas de lenço na cabeça, as velhinhas que recordam a cidade quando o quartel tinha vida e soldados. E elas eram as lavadeiras, que trabalhavam no duro, mas que hoje lamentam a falta que sentem da vida que o quartel trazia a cidade. Essas mesma velhinhas, se estivesse sueste, certamente não estariam ali - o sueste faz doer os ossos, a cabeça também fica 'azoada' - e assim iam perder o concerto magnífico da Orquestra Sinfónica do Exército.

Cheguei atrasada, mas o concerto não tinha começado ainda - se na Marinha quando se chega a horas estão 5 minutos atrasados, ali o relógio não parecia estar a marcar passo. Estavam os músicos a preencher os seus lugares e a tomarem conta dos seus instrumentos. Rapidamente estava o Comandante a dar as boas vindas, a agradecer ao General - e eu sem saber se valeria a pena ter saído na noite de nortada.

Vi o programa antes e tinha cantoras, o que me deixou curiosa. Mas no palco só se via gente de farda, com e sem galões. Eis que começa o espectáculo com músicas estrangeiras - o ingles, sempre o ingles.... já se esqueceram da armada invencivel, já se ve... Continuei a dar o benefício da dúvida, eu e todos os outros que lá estavam, nitidamente gente da terra e gente militar de férias. As cantoras eram sorridentes, animadas, ritmadas em coreografias que assentavam perfeitamente em todo o cenário e o estilo jazz inicial da banda agradava-me - e segundo informaram, uma delas era algarvia e por isso foi como se tivéssemos todos uma das nossas ali no palco.

Lembrou-me um concerto do Michael Buble no LG Theatre nos EUA - mas quando entrou em cena, o cantor não trazia um Hugo Boss, trazia antes um traje militar comum, não diferente do dos outros. Também não era estilo playboy, tinha a forma que a idade lhe tinha dado, mas ainda assim um jeito engraçado e cativante.

Seguiram-se os fados... Foi Deus - lá vamos nós e o estado laico... Mas em tempo de guerra não se limpam armas e até ali tudo estava a valer a pena - vozes maravilhosas, som afinado, boa apresentação, bons tocadores. Seguiu-se o Depois do Adeus - e com esta música eu percebi que ia ser sempre a somar, ou não fosse esta uma das músicas dos militares do 25 de Abril. Ainda assim não tinha noção mínima ainda do que me esperava. Seguiram-se músicas portuguesas, daquelas que todos sabemos e cantamos, enquanto um veleiro subia o canal vagarosamente para também aproveitar o espectáculo e todos esqueciam os problemas do lixo da cidade. Depois Michael Jackson - cheguei a temer que o General não aguentasse tanta ousadia e se pusesse em marcha. Ainda eu não tinha ouvido Amy Whinouse no melhor estilo musical militar de sempre. Vieram Xutos e nessa altura já dançavam veraneantes nas laterais do palco, nada preocupados com a quantidade de uniformes que os rodeavam. Xutos é sempre Xutos e começo a acreditar que não há quem não goste. Por fim Queen, dedicado aos militares em missão no estrangeiro e no combate aos incêndios.

Foi um fantástico concerto, cheio de alegria, a transbordar de animação e que certamente aproximou um pouco todos os lacobrigenses que lidam com militares desde que se conhecem como gente. Que não demorem tantos anos a cá voltar como da última vez. Ah, valente nortada.

quinta-feira, 12 de julho de 2018

Munique para mim

Passou tanto tempo desde que aqui vim da última vez!
Não que não tenha sentido falta de escrever, não que não tenha coisas para contar, não que não tenha desculpas suficientes. Simplesmente é preciso uma série de factores se conjugarem e, ao que parece, não tem acontecido.

Hoje falo de Israel para mim. Para mim, Israel é a história que não quero ter de contar à minha filha, que espero que ela nunca me pergunte o que é, como aconteceu, porque é assim. Tenho assistido ao longo dos anos a episódios com israelitas, pessoas por quem nutro simpatia - costumo nutrir simpatia por pessoas mal tratadas, sou assim, cheia de penas!

Nutro simpatia também pelas crianças que vêm sonhos destruídos por adultos que executam acções sem cabimento em detrimento de políticas descabidas, por pessoas que têm de proteger israelitas quando estes se deslocam ao estrangeiro, pelas pessoas que alteram os nomes verdadeiros para poderem ser normais, pelas pessoas que acedem a retirar bandeiras, pelas pessoas que têm de agarrar ofícios que não os seus, por um país que é demasiado maltratado. Para mim Israel é a prova de que a humanidade não é humana.

Sempre que leio sobre a génese e história Israel, ao fim de algumas palavras e linhas o meu coração toma o lugar do cérebro e desliga o modo leitura. Acho que nunca vou conseguir aceitar isto, nem Munique. Porque para mim, Munique é Israel e Israel é Munique.